A votação da Proposta de Emenda Constitucional 215, que transfere para o poder legislativo a responsabilidade e, na prática, impede a criação de novas Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Territórios Quilombolas foi cancelada hoje na câmara dos deputados.
A lei complementar que regulamenta o art. 231 da constituição e dificulta a regulamentação de terra indígenas também não foi votada. A comissão mista de regulamentação da constituição adiou a votação para o dia 10.
Hoje e ontem houve intensa mobilização de indígenas em Brasília protestando contra a aprovação das duas propostas, com apoio de internautas que realizaram twittaço lançando a PEC 215 nos assuntos mais comentados do twitter. O relatório da proposta, apresentado pelo deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) encontrava-se sob suspeição por ser produzido com auxílio de advogados ligados à Confederação Nacional de Agricultura, entidade ruralista diretamente interessada na aprovação da proposta.
Saiba Mais:
PEC 215 – Relatório “terceirizado” pela CNA
O Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal investigam ruralistas por interferência indevida na tramitação da PEC (saiba mais). Por meio de interceptações telefônicas, o MPF descobriu que Sebastião Ferreira Prado, líder de uma associação de produtores rurais, planejava o pagamento de R$ 30 mil ao advogado Rudy Maia Ferraz, que seria ligado à Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), pela elaboração do parecer que Serraglio apresentou, em novembro, na Comissão Especial da PEC 215 (veja aqui).
Na ocasião, o MPF remeteu documentos relacionados à possível participação de parlamentares federais, no caso à Procuradoria Geral da República, para que sejam adotadas as medidas cabíveis. O esquema foi descoberto, em agosto, durante a investigação de uma organização criminosa que aliciava pessoas para promover a reinvasão da Terra Indígena Marãiwatsédéde (MT). Segundo o MPF, o grupo recebia recursos de outros Estados e apoiaria ações semelhantes na Bahia, Paraná, Maranhão e Mato Grosso do Sul.
Na época, a Justiça Federal em Mato Grosso considerou que os fatos representavam “um desvirtuamento da conduta do parlamentar responsável pela elaboração da PEC, eis que a CNA é parte política diretamente interessada no resultado da mencionada PEC”.
Apresentado por Serraglio como substitutivo, o novo relatório propõe uma ampla gama de exceções ao direito de posse e usufruto das terras por parte dos povos indígenas, além de inviabilizar novas demarcações e legalizar a invasão, a posse e a exploração das terras indígenas demarcadas.
Entre outros pontos, transfere do Executivo para o Congresso a prerrogativa de aprovar a oficialização de TIs, UCs e territórios quilombolas e adota a data de promulgação da Constituição (5/10/1988) como “marco temporal” para comprovar a posse indígena, ou seja, a comunidade teria direito à terra apenas se puder demonstrar que ocupava o território nessa data (saiba mais).
PL que regulamenta o Art. 231 – interesses privados em detrimento do direito indígena
O Projeto de Lei Complementar que regulamenta o Art. 231 da Constituição Federal é assinado pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), ex-líder do governo no Senado, mas, de acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), teria sido elaborado pelo advogado-geral da União (AGU), Luís Inácio Adams. A proposta classifica propriedades rurais como “área de relevante interesse público da União”. Como consequência, o projeto estabelece que essas áreas poderão ser excluídas da delimitação das terras indígenas se seus títulos de ocupação forem “considerados válidos” ou poderão ser objeto de desapropriação ou de compensação com outra área ofertada pela União. Dessa forma, o projeto transforma interesses privados em “de relevante interesse público da União”.
Com informações da Mobilização Nacional Indígena e Instituto Socioambiental
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