“O gavião-real é a maior ave de rapina do Novo Mundo, chegando a 2,2 m de envergadura de asas. Está praticamente extinta na Mata Atlântica, mas tem sido avistada na Reserva Serra Bonita. Uma família de Uiraçus reside aqui, e retornou para cá espontaneamente, sem nenhuma intervenção humana. O Uiraçu voltou para nós!” – Vitor Becker proprietário da RPPN Serra Bonita e fundador do Instituto Uiraçu, que em tupi significa gavião-real.
Uma referência internacional para a pesquisa sobre a Mata Atlântica e a observação de aves e megafauna vem se tornando o papel da Reserva Serra Bonita, em Camacan, Bahia, com novidades ainda pouco divulgadas nos meios de comunicação. Ali já foram descobertas 20 novas espécies de plantas e animais, 27 aves endêmicas, que só existem numa região, e um gavião-real (harpia) adulto foi avistado sobre uma árvore em 2014, após a espécie ser considerada localmente extinta. Pesquisadores desembarcam na Serra Bonita em busca de revelações sobre sua rara diversidade, aumentando a visitação a cada ano na reserva.
Para a preservação dos mais de 2,1 mil hectares de toda a área e para permitir parcerias com universidades e outros segmentos, fundou-se o Instituto Uiraçu, uma ONG que homenageia o gavião-real antes extinto na região. Com isso, a missão dos proprietários em resguardar as matas para as futuras gerações foi fortalecida, mais de 50 projetos de pesquisa foram concluídos na reserva e o local se tornou um núcleo de práticas inspiradoras para a proteção da Mata Atlântica.
Porém, o desenvolvimento desta história esconde outra tão ou mais emocionante que a preservação atual da floresta, envolvendo a determinação familiar que permitiu o sonho de compra de 1,2 mil hectares ainda em 1997. Juntas, cerca de 43 pequenas fazendas foram todas compradas pelo pesquisador Vitor Becker para compor uma só reserva, depois que ele descobriu o risco que a natureza local sofria, com a venda de madeira, caça e outras ameaças.
Quando ainda trabalhava na Embrapa, o pesquisador costumava visitar as matas locais, conhecidas como matas de neblina, para coletar exemplares de mariposas que compunham sua coleção. Poucos sabem, mas ele possui a terceira maior coleção do mundo desses animais (as outras duas são do Museu Britânico e do Museu de História Natural de Washington), e foi ali que localizou espécies raras desses animais ameaçados.
“Percebi que de nada adiantava conservar as amostras desses organismos mortos em museus e coleções, se nada fizéssemos para protege-los vivos, na natureza. Assim, foram anos dedicados à compra das terras, com a soma de minha aposentadoria e fundo de garantia, até conseguir estruturar a RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural) e iniciar a nova aventura da Serra Bonita”, conta Becker no livro “Minha Terra Protegida”, da Aliança para a Conservação da Mata Atlântica.
Sua esposa e filha acompanharam o ideal de mudança de vida, cujo sonho envolve a busca por transformar os 7,5 mil hectares da última parcela de mata de neblina do sul da Bahia numa grande área protegida, garantindo a sobrevivência de sua biodiversidade.
Este ecossistema da Mata Atlântica é quase um testemunho único, com uma vegetação de serra quase sempre coberta por nuvens e altos índices de pluviosidade, que permitiram o desenvolvimento de uma diversidade biológica exclusiva. Só na RPPN foram identificadas mais de 450 espécies de aves e vários primatas endêmicos, e é essa riqueza que o Instituto Uiraçu, hoje com 28 membros, vem conseguindo garantir a partir da persistência e motivação da história da família Becker.
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