A Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou na noite de quarta-feira (10) o Projeto de “Lei do Desmatamento” (PL 219/14), que regulariza usos do solo e atividades irregulares em áreas de preservação e diminui a recuperação de APPs (Áreas de Preservação Permanente), deixando desprotegidas as matas ciliares e nascentes em São Paulo. Com a perspectiva de tornar ainda mais grave a atual crise de água no Estado, o PL é alvo de mobilização da Fundação SOS Mata Atlântica, que alerta para os prejuízos e retrocessos que o projeto trará a São Paulo – com a mobilização, conseguiu adiar a votação durante uma semana. O projeto depende agora de uma sanção do governador Geraldo Alckmin para entrar em vigor.
A coordenadora da Rede das Águas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, que participou da única audiência pública realizada na Assembleia Legislativa com representantes de organizações de defesa do meio ambiente e acompanhou a votação, apontou problemas técnicos na elaboração do projeto. Para a SOS Mata Atlântica, o texto substitutivo aprovado sofreu alterações em relação à proposta original, mas repete os mesmos vícios da norma federal e não foi modificado em sua essência.
“Na prática, todo o retrocesso do novo Código Federal foi agora sacramentado no Estado de São Paulo”, afirmou Malu. “O projeto cria a possibilidade de exportar reserva legal para outros Estados, para recomposição de reserva legal, e descaracteriza completamente a função legal das Áreas de Preservação Permanente para fins de regularização de usos e atividades que até então eram irregulares. As APPs, de acordo com o novo Código Florestal, continuam tendo a função exclusiva de preservar rios, nascentes e mananciais. Por isso, não podemos aceitar que sua recuperação seja diminuída e desrespeitada”, explica Malu.
Segundo a especialista, o texto também não respeitou o acordo para a retirada do artigo que trata do uso de culturas lenhosas e espécies exóticas na recomposição (como pínus e eucalipto), em 50% da faixas de preservação permanente para propriedades com até 4 módulos fiscais, consideradas pequenas. “Relacionar a faixa de APP a ser recuperada com o tamanho das propriedades, com base em indicadores sócio econômicos das regiões, sem considerar a geografia, a dinâmica das bacias hidrográficas e dos rios, criando uma espécie de escadinha para as faixas de recuperação ciliar é um absurdo.
Outra grave ameaça é a diminuição da proteção de nascentes e olhos d’água, por exemplo, cuja faixa de preservação permanente caiu de um raio de 50 metros para apenas 15 metros em áreas consideradas consolidadas. “Resta à sociedade, portanto, denunciar a gravidade do processo de tramitação desse projeto de lei, que não considerou o grande arcabouço legal, técnico e institucional de São Paulo, bem como a crise da água, e cobrar firmeza do Governo do Estado. O governador pode vetar os retrocessos e elaborar um decreto ampliando a proteção e a recuperação ambiental em São Paulo, ouvindo os Comitês de Bacias Hidrográficas para garantir água nas regiões de escassez hídrica e o Consema para as áreas estratégicas para conservação”, explica Malu Ribeiro.
Em estudos recentes da SOS Mata Atlântica divulgados em outubro deste ano constatou-se que a cobertura florestal nativa na bacia hidrográfica e nos mananciais que compõem o Sistema Cantareira, centro da crise no abastecimento de água que assola São Paulo, está pior do que se imaginava. Hoje, restam apenas 488 km² (21,5%) de vegetação nativa na bacia hidrográfica e nos 2.270 km2 do conjunto de seis represas que formam o Sistema Cantareira. Não restam dúvidas de que o desmatamento da Mata Atlântica e da Amazônia tem relação direta com a escassez da água na região sudeste. Com menos proteção florestal, teremos menos água.
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