O município de Brumadinho, em Minas Gerais, vem se tornando cada vez mais conhecido no mundo pela presença do museu de Inhotim (https://www.inhotim.org.br), dedicado às artes contemporâneas, mas também guarda a riqueza de alguns dos maiores remanescentes de Mata Atlântica do Estado. Inversamente à lógica da proteção desse patrimônio, o governo do Estado transferiu a competência pelo licenciamento ambiental dos empreendimentos instalados naquele município para a prefeitura do município, abrindo um precedente para o avanço da especulação imobiliária na região.
Este é um caso emblemático do que vem acontecendo com a implantação da Lei Complementar nº 140 de 2011, que regulamenta a transferência de parte do processo de licenciamento ambiental relacionado à proteção do meio ambiente e ao combate à poluição para a competência dos municípios, deixando de ser responsabilidade exclusiva dos Estados e da União.
Em Brumadinho, a Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA) conseguiu frear a velocidade da implantação dos projetos imobiliários, por meio de uma ação no Ministério Público Estadual. Mas o objetivo maior da ONG é ampliar o processo de discussão sobre os impactos locais dessas atividades.
“Os impactos e efeitos do desmatamento não são somente locais. Suprimir vegetação em estágios primário, médio ou avançado de recuperação não pode ser considerado um impacto localizado, já que os animais expulsos de seus hábitats ou os cursos d’água afetados não conhecem limites geográficos”, defende a superintendente da AMDA, Maria Dalce Ricas, defendendo a ideia de que a gestão territorial vai além dos limites municipais, devendo o poder estadual zelar pela supervisão e monitoramento do licenciamento efetuado pelas prefeituras, de forma a garantir a conservação e o uso sustentável dos recursos ambientais da Mata Atlântica.
O posicionamento de Dalce é relevante, num momento em que leis ou decretos municipais tem o poder de transformar uma área rural em área de expansão urbana, independentemente das características de relevância ambiental que possuam. E respaldado pela referida lei federal de 2011, muitas vezes o poder público estadual alega não poder interferir nas prerrogativas do município em legislar de forma complementar às normas estaduais e federal.
Para a Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), é necessário que os municípios tenham estrutura financeira, recursos materiais e corpo técnico adequados para assumirem a responsabilidade pelo licenciamento. “Mas os órgãos e conselhos municipais estão fragilizados e enfraquecidos, justamente no território onde a pressão a favor do licenciamento municipal é maior”, coloca Paulo Pizzi, que integra o Conselho de Coordenação Nacional da RMA e é presidente da ONG Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais.
Segundo Dalce, nos locais onde o Estado assinou convênio para os municípios licenciarem os empreendimentos, a expansão sobre os remanescentes cresceu, como em Ibirité, Nova Lima e Brumadinho. “Em Ibirité o secretário de meio ambiente solicitou formalmente ao Instituto Estadual de Florestas (IEF) a alteração da zona de amortecimento do parque estadual para implantação de condomínios. Neste caso específico, a ação da associação de moradores, de ONGs locais e da AMDA barrou a iniciativa, mas não é uma regra geral”, conta Dalce.
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