Artigo de Márcia Hirota *
Para a maioria de nós, dia de aniversário é dia de comemoração. Mas já há algum tempo, infelizmente para a Mata Atlântica não tem sido assim. Em 27 de maio, comemoramos o Dia Nacional da Mata Atlântica. É nesse dia também que a Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) divulgam dados do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, estudo que monitora, há 28 anos, os desmatamentos desta que é a floresta mais ameaçada do país.
O novo levantamento monitorou, entre 2012 e 2013, os 17 Estados abrangidos pelo Bioma Mata Altântica: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Alagoas, Sergipe, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. E o resultado observado foi um aumento de 9% do valor bruto do desmatamento comparado com o ano anterior. No total, foram suprimidos 23.948 hectares, ou 239 Km², de vegetação nativa. Para ficarmos no assunto futebol, tema da hora, essa área é equivalente a nada mais nada menos do que 24 mil campos de futebol.
A grande questão é que vivem na Mata Atlântica 69% da população brasileira, algo em torno de 118 milhões de habitantes distribuidos por 3.284 municípios – 59% dos existentes no Brasil. Proteger essa floresta é garantir os serviços ambientais e a qualidade de vida das pessoas que habitam essas regiões. A destruição da vegetação reflete diretamente em questões fundamentais para nós, como a qualidade do ar ou a produção e o abastecimento de água. São Paulo, por exemplo, vive hoje um delicado momento em relação ao fornecimento de água. O desmatamento não é a causa da seca, mas uma maior cobertura vegetal evitaria o desaparecimento de nascentes e o esgotamento dos reservatórios. No Blog do Planeta, o jornalista Bruno Calixto abordou bem o assunto na matéria “Para não faltar água, proteja a Mata Atlântica”, disponível em http://goo.gl/gIcGRS.
Minas Gerais é o estado campeão do desmatamento pelo quinto ano consecutivo, com 8.437 hectares (ha) de áreas devastadas, seguido do Piauí (6.633 ha), Bahia (4.777 ha) e Paraná (2.126 ha). Juntos, os quatro estados são responsáveis por 92% do total dos desflorestamentos, o equivalente a 21.973 ha.
Apesar de liderar a lista, Minas apresentou redução de 22% na taxa de desmatamento, que em 2011-2012 foi de 10.752 ha. A queda é resultado de moratória que desde junho do ano passado impede a concessão de licenças e autorizações para supressão de vegetação nativa do bioma. A ação foi autorizada pelo Governo de Minas Gerais após solicitação da SOS Mata Atlântica.
Em segundo lugar no ranking, o Piauí mais que duplicou as áreas desmatadas de Mata Atlântica, o que é muito preocupante. Foram 6.633 ha de áreas desmatadas, um aumento de 150% em relação aos índices registrados no período 2011-2012 (2.658 ha).
A Bahia, terceiro Estado que mais desmatou o bioma, perdeu 4.777 ha, um aumento de 6% em relação aos 4.516 ha do período anterior. Em quarto lugar no ranking, o Paraná teve uma perda de 2.126 ha de floresta nativa. Se comparado aos 2.011 ha suprimidos no ano anterior, o aumento também foi de 6%.
Já os destaques positivos são São Paulo, Alagoas, Espírito Santo e Rio de Janeiro, que tiveram redução de desmatamento de 51%, 88%, 43% e 72%, respectivamente. Nesses estados que apresentaram baixos índices de desmatamento a preocupação é com o que temos chamado de “efeito formiga“. Não há mais desmatamentos de grandes proporções, mas eles ainda acontecem para expansão de moradias e infraestrutura. Só não aparecem no nosso levantamento porque são áreas menores de 3 ha.
Confira o ranking completo no site da SOS Mata Atlântica: http://www.sosma.org.br/17811/divulgados-novos-dados-sobre-o-desmatamento-da-mata-atlantica/
Uma alternativa para começarmos a reverter este triste histórico de desmatamento é a criação dos Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA), que reúnem e normatizam os elementos necessários à proteção, conservação, recuperação e uso sustentável da Mata Atlântica, único bioma com uma lei específica e protegido pelo Mapa da Área da Aplicação da Lei da Mata Atlântica (11428/2006). Quando o município faz o mapeamento das áreas verdes e indica como elas serão administradas – por exemplo, se vão virar um parque ou uma área de proteção ambiental – fica muito mais fácil conduzir processos como o de licenciamento de empreendimentos.
Outra ação importante é o incentivo à criação de Unidades de Conservação (UCs) e de reservas particulares, as chamadas RPPNs. Cerca de 80% do que sobrou da Mata Atlântica está em propriedades particulares e não teremos sucesso na conservação do bioma mais ameaçado do Brasil se não protegermos parte dessas áreas.
Com o compromisso de atuar em prol do bioma e da qualidade de vida das gerações futuras, nós, da Fundação SOS Mata Atlântica, junto a diversos parceiros, daremos continuidade aos projetos que desenvolvemos para a proteção da Mata Atlântica. Mas sucesso mesmo, e um Dia da Mata Atlântica para comemorarmos, só teremos quando cada vez mais pessoas estiverem mobilizadas e unidas pela defesa desta floresta. Viva a Mata Atlântica!
*Marcia Hirota é diretora-executiva da Fundação SOS Mata Atlântica
Este artigo foi originalmente publicado no Blog da Revista Planeta, em 27 de maio de 2014
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